sábado, 17 de março de 2012

Por uma Filosofia da Balada IV


Acho muito engraçadas as descrições de festas. Todas miseravelmente parecidas: os mesmos apelos, as mesmas palavras, o mesmo espírito e a mesmíssima tentativa de ser interessante, leve, divertido, único. Será que alguém leva aquilo a sério? Não sei, não tenho como saber, mas essa é uma resposta irrelevante, porque duvido que quem freqüenta a balada realmente espere algo novo: é sempre mais do mesmo, estando a variação resumida ao acaso dos encontros e desencontros.

A questão que se coloca, aos menos para os desavisados como eu, é a seguinte: como ser diferente? Como demonstrar uma singularidade a fim de fazer-se notar por alguém que também não se enquadra na massa amorfa? Não me refiro à alternativa de destacar-se com uma roupa de marca, tatuagem à mostra, óculos com armação chamativa – soluções tão comuns (de novo, tão iguais) nesses ambientes em que se suprime o diálogo em prol da supremacia do olhar.

Essas são soluções bastante coerentes, devo reconhecer, pois a comunicação reinante na noite é a visual. A arquitetura da balada – ruído acachapante, estímulo rítmico e jogo de luzes – obriga que as interações se estabeleçam a partir do corpo e do movimento (da aparência, enfim), donde o sentido de sobressair-se por meio de algo que possa ser visto. Adotar essa estratégia, porém, significa mergulhar no modus operandi da noite e não, a rigor, diferenciar-se.

Ao que me parece, é impossível distinguir-se na noite de uma maneira que não seja, como tudo o mais, previsível. Se o contato entre duas pessoas há de ser intermediado exclusivamente pela aparência, não há escapatória da visualidade. A única saída para de fato distinguir-se ou encontrar alguém diferente seria reabilitar o diálogo, justamente o que a noite não permite. Em outras palavras: a única saída seria sair da própria noite ou, ao ser abordado por alguém ou chegar numa pessoa interessante, comportar-se de modo absolutamente inusual para os padrões da balada: conversar longamente, talvez citando, para dar início ao papo, a frase que um grego antigo dizia às suas pretendentes: fale para que eu possa te ver.

2 comentários:

  1. Além da fala, do discurso de cada um, também seria possível " ver" o tom da voz do outro, o seu som particular, sua singularidade musical. Para isso, dentro da própria noite pode haver talvez um exílio, um exílio dentro da noite. Passando por aqui e gostando de ter notícia de que a filosofia anda passeando por lugares como a balada!

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  2. Tô imaginando você, no meio de uma balada, às 3h da manhã, com um olhar 71, encostando devagar em uma pessoa e sussurando: " fale para que eu possa te ver" Hehehehhe!

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