segunda-feira, 30 de julho de 2012

Apologia à Noite


Sejamos verdadeiros: quem agüenta ser sério todo o tempo? Quem suporta o peso da coerência sem jamais incorrer em contradição? Quem nunca cometeu uma extravagância? Quem nunca disse “que se dane o amanhã, depois eu me viro”? Quem nunca?

E quem nunca beijou sem compromisso? Teve uma transa pela transa? Quem nunca se perdeu de tesão? Quem nunca se permitiu um álcool a mais? Dançou de olhos fechados curtindo o movimento do corpo? Quem nunca olhou de soslaio para conferir um rabo de saia? Ou um abdômen torneado? Quem nunca?

Quem nunca sonhou acordado com prazeres secretos? Ou mergulhou no sexo esquecendo-se de si? Quem nunca foi para a noite à flor da pele? E escolheu seu par pelo rosto, pelo peito ou pela bunda? Quem nunca se arrependeu de um monte de coisas? E as repetiu pouco depois? Quem nunca fingiu-se contido fervendo por dentro?

Quem nunca condenou os outros e se viu fazendo o mesmo? Quem nunca teve inveja de quem realiza um desejo proibido para nós? Quem nunca quis ser puta? Quem nunca quis bater? Apanhar? Quem nunca caiu de boca?

Quem nunca desejou a loucura? Ardeu de desejo? Quem nunca quis tudo neste instante agora? Correr como um cavalo? Lançar-se num precipício? Quem nunca quis só o prazer? Quem nunca agiu sem pensar e viu que foi bom?

Sejamos verdadeiros: alguém nunca?

Um comentário:

  1. Li alguns textos da página principal e são muito parecidos com algumas reflexões que tenho às vezes, mas esse "Apologia à Noite" foi o mais intrigante. Verdadeiro sem ser clichê ou raso.
    E a frase "Porque só a palavra torna real" me lembrou Eco em 'O Cemitério de Praga', quando o autor diz que "basta falar de algo para esse algo passar a existir". Coincidência?

    E, como acabo de comentar com um amigo: achei um blog muito bom.

    ResponderExcluir