Minha
mãe contava que, no tempo dela (nem tão longe assim), havia um rito para o
flerte: ir à praça e caminhar em círculos, as mulheres num sentido e os homens
no outro, todos atentos aos sinais que podiam ser emitidos, normalmente bem
discretos: um sorriso, uma piscadela. Confesso que, num primeiro momento, não
acreditei no relato: aos meus olhos, pareceu pré-histórico. No entanto,
compreendi depois, era a época das escolas separadas entre meninos e meninas,
dos assentos na igreja reservados aos senhores e senhoras, práticas que existiram,
por mais inimagináveis que soem.
Conta
minha mãe que, à noite, os jovens freqüentavam bailes (não baladas), trocavam olhares,
bebiam um pouco e dançavam. Havia a expressão “par constante” para aqueles que
sempre dançavam juntos e não namoravam. Isso de ficar, como todos sabemos,
estava fora de cogitação. O ficar é uma invenção genial, mas bastante recente.
Apenas de uns tempos para cá é que os contatos da noite, em especial com o sexo
oposto, não se fazem mais a duras penas, asfixiados por interditos. Hoje o
desejo pode se manifestar de modo muito menos enviesado. As aproximações são
mais fáceis e é até possível uma amizade franca entre homem e mulher.
Ao
contrário de muitos que o recriminam ou lamentam, arrisco-me a dizer que não se
namora menos por causa do ficar. Quando existe a vontade de permanecer junto,
tudo se passa como antigamente. Não faz sentido denegrir o ficar afirmando que
é menos durável. Seu valor reside na efemeridade e nas descobertas de si e dos outros
que dele provêm. Seguramente, o namoro é algo que não interessa a todas as
pessoas que estão na balada, mas o fato é que estamos diante de dois
comportamentos (namorar e ficar) que operam em registros diferentes. Cabe a nós
aprender a caminhar nas praças que freqüentamos.
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