quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Praças e Praças


Minha mãe contava que, no tempo dela (nem tão longe assim), havia um rito para o flerte: ir à praça e caminhar em círculos, as mulheres num sentido e os homens no outro, todos atentos aos sinais que podiam ser emitidos, normalmente bem discretos: um sorriso, uma piscadela. Confesso que, num primeiro momento, não acreditei no relato: aos meus olhos, pareceu pré-histórico. No entanto, compreendi depois, era a época das escolas separadas entre meninos e meninas, dos assentos na igreja reservados aos senhores e senhoras, práticas que existiram, por mais inimagináveis que soem.

Conta minha mãe que, à noite, os jovens freqüentavam bailes (não baladas), trocavam olhares, bebiam um pouco e dançavam. Havia a expressão “par constante” para aqueles que sempre dançavam juntos e não namoravam. Isso de ficar, como todos sabemos, estava fora de cogitação. O ficar é uma invenção genial, mas bastante recente. Apenas de uns tempos para cá é que os contatos da noite, em especial com o sexo oposto, não se fazem mais a duras penas, asfixiados por interditos. Hoje o desejo pode se manifestar de modo muito menos enviesado. As aproximações são mais fáceis e é até possível uma amizade franca entre homem e mulher.

Ao contrário de muitos que o recriminam ou lamentam, arrisco-me a dizer que não se namora menos por causa do ficar. Quando existe a vontade de permanecer junto, tudo se passa como antigamente. Não faz sentido denegrir o ficar afirmando que é menos durável. Seu valor reside na efemeridade e nas descobertas de si e dos outros que dele provêm. Seguramente, o namoro é algo que não interessa a todas as pessoas que estão na balada, mas o fato é que estamos diante de dois comportamentos (namorar e ficar) que operam em registros diferentes. Cabe a nós aprender a caminhar nas praças que freqüentamos.