domingo, 12 de dezembro de 2010

Zoológico XXI

Quando ainda adolescente, fiz uma viagem para o norte de Minas. Visitei uma pequena comunidade chamada Tanque, que mal totalizava duas dezenas de famílias. Era, se me lembro bem, um distrito de Porteirinha e, na ausência de hotel ou pousada, um casal com três filhos hospedou-me em sua casa.

Dentre muitas coisas que me marcaram, cito um episódio. O caçula da família que me recebeu, chamado Lázaro, ficava sempre a meu lado, como que tomando conta de mim, a ponto tal que resolvi lhe pedir um favor: indicar-me tudo que achava que eu não conhecia, sobretudo plantas, frutas e animais. Tive, como conseqüência, dias maravilhosos incrustados com pequenas descobertas. Numa determinada tarde, ele me pediu silêncio e indicou uma trilha. Segui-o calado até que apontou: um gato! Caí na gargalhada: “Uai, ocê tá achando qu’eu não conheço gato?! Gat’eu conheço! Eu sou da cidade, mas alguns bichos eu já vi.”

Pois outro dia soube de uma notícia ótima. Um zoológico da Alemanha resolveu colocar vaca em exposição. Tomei um grande susto, mas depois me recompus, tendo recordado minha viagem a Tanque. Não há que surpreender a decisão dos administradores daquele zôo. Cada vez mais distanciados de experiências diretas com a natureza, estamos perdendo o contato mesmo com animais relativamente comuns, para não falar em outras perdas, talvez mais relevantes, causadas pela nossa vida urbana, demasiado urbana.

Comentando a notícia entre colegas, escutei histórias de amigos professores e descobri que há crianças que nunca viram galinha, que pensam que frango nasce no freezer, que não imaginam como é um porco e que sentem nojo de leite ao saber que saiu de uma teta. Todas crianças brasileiras, para as quais documentários à la Discovery ou viagens a praias bem administradas esgota o contato com o mundo, por assim dizer, selvagem. Crianças brasileiras, como alemãs, inglesas, francesas – como qualquer criança citadina?

A continuar assim, os netos do Lázaro terão muito mais trabalho do que aquele que lhe dei, se é que nós ainda cogitaremos nadar em rios (e não em piscinas cloradas), sujar os pés com terra (e não o sapato com pó asfáltico), colher frutas no pé (e não em prateleiras), olhar montanhas (e não fachadas de prédio), sentir o vento (e não o ar-condicionado), se é que nós, afinal de contas, ainda seremos humanos (e não apenas bichos urbanos).

2 comentários:

  1. §74, "Mamut".

    http://books.google.com/books?id=mryPzGJvXgoC&pg=PA120&lpg=PA120&dq=mamute+minima+moralia&source=bl&ots=vAcM7L6_aN&sig=izHdtBoTFvlHgVo17PaX6YvrIQY&hl=de&ei=EuoITcSjJ4qX8QOy7Mwy&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=1&ved=0CBYQ6AEwAA#v=onepage&q&f=false

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  2. Eu tive uma galinha de estimação , o nome dela era Dorotéia. Mas um dia, para a minha coleção de traumas, uma raposa - malvada - fez Dorotéia de refeição.

    Ainda guardo a lembrança de Dorotéia, ela era muito bonita e gorda.

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