segunda-feira, 23 de maio de 2011

Do doce vinagre

A recente beatificação do Papa João Paulo II fez com que eu me atentasse para algo que nunca havia notado. Não, não me refiro à incompreensível distinção entre santo e beato, mas a algo mais prosaico: às sessões de milagres de algumas igrejas evangélicas (milagre com dia e hora marcados?) e a profusão de milagres nessas mesmas sessões (milagres contados às dezenas?). ‘Milagre’ se tornou um termo corriqueiro, repetido à exaustão. De tão falado, aliás, parece até natural, fenômeno cotidiano. Será que não é o caso de reabilitarmos o advogado do diabo?

Seja como for, acredito que, para além do campo religioso, estamos eivados de algo que poderíamos chamar de “lógica do milagre” e que somos muito simpáticos a ela. É que, várias vezes, aspiramos a soluções fáceis e súbitas de nossos problemas, como se fosse possível nos livrarmos das pedras de nossos sapatos por um passe de mágica. Acho que essa é uma boa perspectiva para pensar a loteria, as cirurgias plásticas e muitas outras coisas: de repente, como que por um milagre profano, mudamos de vida, de corpo... E sem nenhum esforço, sem ter de trabalhar, sem ter de fazer dieta, sem ter de comer o pão que o diabo amassou!

O lamentável dessa lógica é que nos colocamos numa posição completamente passiva. Resignados ou desesperados, ficamos postados à espera de um redentor (um mestre, um deus, um curandeiro, a sorte) e sonhamos com a resolução repentina de nossos males, antevendo o gosto do vinho sem notar que a água avinagre-se.

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