segunda-feira, 9 de abril de 2012

Algo Mais


Nunca faço cálculos quando quero reencontrar alguém que conheci na noite. É terrível ter de pesar que horas enviar o sms, avaliar o que dizer, especular o que a outra pessoa pode pensar. E telefonar então? Parece uma grande ousadia, só maior que a de pedir o número. Na balada, a gente nunca sabe quem está querendo algo mais (mais que ficar, mais que uma transa) e acho que a tendência é jogarmos todo mundo na vala comum da pegação. E aí, quando o encontro foi bom e deu vontade de reeditá-lo, surge aquela dúvida do que fazer.

As redes sociais podem dar uma ajuda, mas não resolvem tudo. Aliás, elas não resolvem nada, porque a dificuldade está no contato, ou melhor, em como contactar a outra pessoa. Que tom adotar? Um mais direto: “gostei de você, quero te rever”? Ou mais sugestivo: “foi um prazer te conhecer”? Acho que tenho um medo compartilhado por muitos: fazer a outra pessoa fugir, desaparecer.

Já notei, por exemplo, que a delicadeza pode ser problema. Se ficamos com alguém que estava querendo apenas algo casual ou para quem o encontro na noite, mesmo tendo sido bom, não despertou o desejo firme de um reencontro, uma gentileza pode ser fatal. Ela certamente será interpretada como um prelúdio de algo sério e causará verdadeiro espanto. O chato é que, muitas vezes, nossas delicadezas ficam sem resposta alguma. É muito triste quando isso ocorre, porque bastava dizer que não estava mais afim, que foi bom, que valeu, que a gente se vê por aí, qualquer coisa é melhor que o ato de ignorar. 

Pelo menos, eu sou das pessoas que não insiste, porque insistir é chatíssimo e pode chegar a níveis humilhantes. Considero-me uma pessoa direta, mas não daquelas que colocam os outros na parede. Pressionar, tolher a liberdade – nada disso adianta. Busco ser claro, sutil e tão amável quanto possível; busco ser o que sou, sem joguinhos. De uns tempos para cá, já não me importo se fogem de mim quando escrevo ou ligo no dia seguinte demonstrando o que estou sentindo. Fico até mais tranqüilo: não posso me relacionar com quem teme a delicadeza e não sabe responder um gesto de afeto.

3 comentários:

  1. Gosto de demais dos seus textos, parabéns!

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  2. "Talvez devesse lançar um manifesto pela delicadeza. Drummond dizia: "Sejamos pornográficos, docemente pornográficos". Parece que aceitaram exageradamente seu convite, e a coisa acabou em "grosseiramente pornográficos". Por isso, é necessário reverter poeticamente a situação e com Vinícius de Morais ou Rubem Braga dizer em tom de elegia ipanemense:

    Meus amigos, meus irmãos, sejamos delicados, urgentemente delicados.

    Com a delicadeza de São Francisco, se pudermos.

    Com a delicadeza rija de Gandhi, se quisermos."


    Lembrei demais disso. Tempo de delicadeza, do Affonso Romano de Sant'Anna.

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    1. Esse livro do Affonso Romano de Sant'Anna é de uma grande beleza. Sinto uma ternura só de lembrar dele.

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